No âmbito do empréstimo da escultura Corpus Delicti (1993) de Jac Leirner destaca-se esta obra pertencente à Coleção da Caixa Geral de Depósitos (CGD). A escultura integra a exposição Acloc o´clock (ciclo Território #7), um projeto de Uma Certa Falta de Coerência (André Sousa e Mauro Cerqueira), na Culturgest – Porto, patente de 8 de fevereiro a 11 de maio de 2025.

O corpo de trabalho que a artista tem vindo a desenvolver concentra-se numa aproximação ao Dadaísmo, nomeadamente ao ready-made de Marcel Duchamp, mas com ecos na Arte Pop, Conceptualismo e Minimalismo. Esta linhagem descontextualiza os objetos do quotidiano que a artista coleciona de forma muito obsessiva e durante um longo período. Notas de dinheiro, moedas, sacos de plástico e de papel, maços de cigarros, lápis, calendários, autocolantes, são alguns dos objetos que acentuam a crítica ao consumo e ao vício que a artista tem privilegiado no seu trabalho. As suas obras revelam “uma nova maneira pela qual a vida pode vitalizar a arte ou a arte revelar a vida.” (Guy Brett). Através da deslocação do objeto da sua função quotidiana para o meio artístico, renegando assim o conceito de belo, a artista busca “o que é próprio de cada coisa até o momento epifânico da obra de arte.” (Paulo Herkenhoff).

Ao contrário de grande parte das obras da artista, a série intitulada Corpus Delicti, realizada entre 1985 e 1993, não contraria o significado dos objetos utilizados. Uma das obras desta série trata-se de um conjunto de cinzeiros roubado das viagens que a artista realiza na aviação comercial. O objeto obsoleto, tendo em conta que já não se pode fumar nos aviões e as companhias aéreas já não se querem associar ao ato de fumar, potencia a significação do título. O Corpo de Delito é o conjunto de vestígios materiais resultantes de uma prática criminosa, que poderão ser usadas como provas do crime cometido. Este conjunto de obras genericamente intitulado Corpus Delicti também é composto por copos e sacos de enjoo, todos furtados aos aviões. A obra que pertence à Coleção da Caixa Geral de Depósitos é constituída por um conjunto de almofadas de pequenas dimensões, com diversos tecidos e cores de companhias aéreas. Não obstante a relação direta entre o título e o objeto, a obra enrola-se sobre si própria em forma de caracol, perpetuando a função de conforto e de sono para a qual a almofada remete. “Assim, no frenesim de viagens que é a condenação da maior parte dos artistas contemporâneos num mundo histericamente globalizado, o pequeno delito de furto que estas obras demonstram é quase uma pequena provocação disfarçada de escultura.” (Delfim Sardo)

Jac Leirner formou-se em Artes Plásticas, em 1984, na Fundação Armando Álvares Penteado (FAAP), em São Paulo, Brasil, onde também foi professora, entre 1987 e 1989. Em 1991, foi artista residente no Walker Art Center, em Minneapolis, E.U.A.. No mesmo ano foi professora convidada na Oxford University e artista residente no museu Modern Art Oxford. Em 2001 foi bolseira da John Simon Guggenheim Memorial Foundation, em Nova Iorque, E.U.A.. Em 1983 e 1989 participou na Bienal de São Paulo e em 1992 na IX Documenta de Kassel. Por 2 ocasiões, 1990 e 1997, representou o Brasil na Bienal de Veneza.

Hugo Dinis

JAC LEIRNER
Corpus Delicti
1993
Almofadas e lençóis de companhias aéreas
41 x 100 x 35 cm
Inv. 539171
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