No âmbito do empréstimo para a exposição Pequenos Fogos: José Leonilson e Tomás Cunha Ferreira, patente até 26 de fevereiro, na Brotéria – Associação Cultural e Científica, em Lisboa, destaca-se a obra Cara e Coroa (1984), de José Leonilson Bezarra Dias (Fortaleza, Ceará, Brasil, 1957 - São Paulo, Brasil, 1993), pertencente à Coleção da Caixa Geral de Depósitos desde 2001.

Nascido em Fortaleza, em 1957, muda-se com a família para São Paulo em 1961. Entre 1977 e 1980 estuda na Fundação Armando Álvares Penteado (FAAP). Em 1981 e em 1982, viaja por diversas cidades europeias e trava conhecimento com o meio artístico internacional. Desde então, a sua carreira desenvolveu-se na área da pintura, desenho e escultura, alcançando diversas mostras internacionais, tanto na Europa como nos Estados Unidos da América. Em 1991, ao testar positivo ao HIV, o seu trabalho torna-se mais denso e politicamente mais engajado. O corpo, nomeadamente, o seu próprio tomará parte das suas preocupações estéticas. Morre dois anos depois, em São Paulo, com apenas 36 anos. Nesse mesmo ano, amigos e familiares, fundam o Projeto Leonilson com o objetivo de inventariar, investigar, arquivar, cuidar e divulgar o seu imenso legado.

A sua obra está intrinsecamente ligada às suas vivências pessoais – “O mundo exterior não existe, diz ele. O que a gente procura está dentro de nós” (Felipe Chaimovich, 1991). Acrescenta ainda noutra entrevista: os trabalhos ”eram completamente pessoais, subjectivos; era um diário, mas eu tinha uma conversa muito mais não concentrada, sabe?” (Ivo Mesquita, 1997). Como se de um diário se tratasse o seu trabalho anota em pequenos signos ou símbolos diversos significados camuflados e misteriosos, ilustrando e traduzindo plasticamente a sua vida quotidiana. 

No início dos anos 80, o artista regressa ao prazer da pintura, que “se impõe transmitindo uma mensagem alegre, colorida e irónica” (Lisette Lagnado, 1995), através de cores vibrantes, da leveza das formas e do humor dos temas representados. Este registo gráfico torna-se evidente na pintura Cara e Coroa (1984). A representação das duas faces da mesma moeda, pode inferir sobre a sorte e o destino. São estas indecisões e segredos que permitem as interrogações dos seus espectadores. Ler, reler, decifrar, indagar, entre outras, são alguns dos verbos que fazem parte do léxico que o artista reclama para si. Ao construir uma linguagem muito própria, por vezes indecifrável, outras vezes acessível apenas na privacidade, o artista tenta uma expressão plástica que seja universal e que seja apreensível não apenas porque tal imagem, acontecimento ou objeto são identificáveis, mas porque se sente através da experiência autêntica e ambígua. “De fato, ambiguidade é palavra-chave na fala de Leo, e a perseguem problematizações e dilemas.” (Adriano Pedrosa, 1995).

Hugo Dinis

Leonilson
Cara e Coroa
1984
Acrílico sobre tela
219 x 212 cm (220 x 234 cm)
Inv. 534009
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