No âmbito do empréstimo da pintura Sem título (1973) de Fernando Calhau (Lisboa, Portugal, 1948 – 2002) destaca-se esta obra pertencente à Coleção da Caixa Geral de Depósitos (CGD). A pintura integra a exposição #Slow #Stop... #Think #Move, com curadoria de Ana Anacleto, do ciclo Território #2, que a Culturgest organiza na Fidelidade Arte, Lisboa, entre 20 de fevereiro e 5 de maio de 2023.

Em 1973, Fernando Calhau licenciou-se em Pintura na Escola Superior de Belas Arte em Lisboa. No ano seguinte, estudou gravura na Slade School of Fine Art, em Londres, com Bartolomeu Cid dos Santos, como bolseiro da Fundação Calouste Gulbenkian. O seu trabalho desenvolveu-se por séries que se estendiam por um período alargado de tempo. A sua primeira grande produção artística desenvolveu-se entre 1972 e 1975, onde se insere a pintura que pertence à Coleção da Caixa Geral de Depósitos desde 1986. A série distingue-se pela cor verde e foi realizada em três dimensões distintas: 145 x 145 cm, 110 x 100 cm e 55 x 55 cm. Segundo Nuno Faria “as pinturas são superfícies monocromáticas atravessadas por entradas lumínicas de cor em forma de cruz, espécie de marcações do campo da imagem.” (Convocação I e II, Fundação Calouste Gulbenkian, 2006, p.259) Delfim Sardo acrescenta: “São, assim, pinturas muito simples, efectuadas com uma enorme mestria técnica, que revelavam a paixão de Fernando Calhau pelo minimal, apagando voluntariamente qualquer marca da mão em favor de uma aparência acetinada e uniforme.” (Abrir a Caixa, Fundação Caixa Geral de Depósitos – Culturgest, Lisboa, 2009, p.62).

Contudo é em discurso direto que melhor se entendem as intenções do artista: “Para mim, a efectiva influência minimal começou nos anos 70, com a série dos quadros verdes. Foi nessa altura que tomei consciência das minhas filiações.” (Work in progress, Fundação Calouste Gulbenkian, 2001, p.57) Na mesma conversa com Delfim Sardo o artista ainda acrescenta: “Sei que tinha uma simpatia pela cor verde, uma simpatia que nunca percebi porquê.” (idem, p.73); “O facto de não ter presença física de pincelada era importante para mim, tanto mais que os fundos eram, de facto, pintados à trincha, não eram pintados à pistola, mas eram pintados em camadas muito finas de tinta de forma a não ficar nunca marcada uma pincelada.” (idem, p.83)

As palavras de Ernesto de Sousa ainda ressoam na singularidade da memória da obra de Fernando Calhau: “Silêncio, indiferença, vazio... nada. A página branca, a pintura monocroma. (...) Desde muito cedo os quadros verdes e vazios de Calhau, em molduras impossíveis ou de algum gozo irónico, foram mais do que a expressão abismal do nada a que já se referia Goya, uma recusa simples e jovem face ao jogo das falsas e saloias competências; a expressão de um vazio menos metafísico e virtuoso, mas de qualquer maneira autêntico: este nosso vazio de trazer por casa. Verde em todo o caso, como os campos, e ainda assim rural e lírico, povoado de frescura e primavera.“ (Colóquio-Artes, nº 27, 1976, p.38)

Paralelamente à sua carreira artística, Fernando Calhau teve um papel muito importante na divulgação da Arte Contemporânea. Entre 1992 e 1997 assumiu o cargo de Consultor da Administração da Caixa Geral de Depósitos para a aquisição de obras de arte. E a sua extensa carreira na Secretaria de Estado da Cultura, onde dá início formal, em 1997, ao Instituto de Arte Contemporânea, que dirigiu até 2000, atestam, por outro lado, as suas capacidades ímpares no panorama cultural português.

Hugo Dinis

Fernando Calhau
Sem título
1973
Acrílico sobre tela
55 x 55 cm
Inv. 439328
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