No âmbito da exposição João Hogan. Algo que jamais tem fim destaca-se a gravura Sem título (1971) pertencente à Coleção da Caixa Geral de Depósitos (CGD). A exposição, uma co-produção com Culturgest, estará patente no Panteão Nacional entre 10 de setembro a 1 de dezembro de 2024, assinala os 110 anos do nascimento do pintor.
Nascido a 4 de fevereiro de 1914, em Lisboa, no seio de uma família de artistas de ascendência irlandesa, era neto do aguarelista Ricardo Hogan e sobrinho do pintor Álvaro Navarro Hogan. Em 1930, começa a trabalhar numa oficina de marcenaria, profissão a que se dedicou por mais de vinte anos e que viria a revelar-se uma formação essencial para o percurso artístico que encetou, como pintor bem como gravador, por meio da precisão do traço do desenho e de uma metódica construção da composição e das cores. Em 1930 frequenta o curso geral da Escola de Belas-Artes de Lisboa. Viria, porém, a abandonar o ensino académico para ingressar na Sociedade Nacional de Belas-Artes, em 1937. A sua primeira exposição individual é realizada apenas em 1951. Em 1956, torna-se um dos sócios fundadores da Gravura – Sociedade Cooperativa de Gravadores Portugueses. O trabalho que realizou nestas duas vertentes da sua obra — pintura e gravura — viria a apresentar uma dicotomia de estilos profundamente diferentes, que extravasou o meio artístico português da sua época.
João Hogan ficou notoriamente reconhecido pela sua pintura de paisagem que desvela uma visão crua, árida e deserta da presença humana, de uma zona de transição entre a cidade e o campo. Contudo, a exposição mostra a sua surpreendente faceta como gravador. Em 1957, começa a trabalhar com afinco na técnica da gravura. Nas primeiras gravuras sobre madeira que realizou, persiste ainda o cunho realista e a aproximação à sua pintura. Contudo, o artista esclarece: “(...) é provável que este meu estranho mundo da gravura muito tenha contribuído para pôr termo ao pendor naturalista que a minha pintura manteve até aos anos 50.” Rui Mário Gonçalves escreve sobre ele que “o gravador iria libertar as emoções e os sonhos.” Após a década de 60, com a maturação da sua pintura e a ausência de construções e figuras humanas, as gravuras em cobre manifestam influências surrealistas que atingem uma humorística fantasia da irrealidade latente. Estas composições, delirantes e líricas, evidenciam uma liberdade e criatividade no desenho e nas narrativas, que contrastam em grande medida com a austeridade que as pinturas denotavam. O universo fantástico e a invenção do sonho revelados nas gravuras, como que contrariam a paisagem silenciosa e árida das suas pinturas. O artista refere: “(...) nunca quis que a minha gravura fosse uma reprodução da minha pintura.” Para Rocha de Sousa, a gravura de Hogan “(...) leva-o a uma descoberta onírica cuja densidade poética se inscreve num mundo subterrâneo e nocturno.”
João Hogan morreu de acidente vascular cerebral, em Lisboa, a 16 de junho de 1988. Em 1992, o Centro de Arte Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian presta-lhe uma mais que justa homenagem com a organização da exposição antológica, onde são apresentadas pinturas e gravuras numa harmonia notável. Em 1993, a mesma instituição apoia o filme “Hogan – o pintor”, com realização e produção de Tereza Martha.
Hugo Dinis
Papel (38 x 56 cm) / Superfície impressa (24,5 x 33 cm)
Ed. 1/150 + XX P.A.
Inv. 626155